domingo, 21 de abril de 2013

Dossiê sobre últimos escritos de Milton Schwantes


Revista Caminhando v. 17, n. 2, p. 7-106, jul/dez. 2012

Os artigos desta revista estão baseados, especialmente, em aulas escritas para o Programa de Pós-graduação da Universidade Metodista de São Paulo (Umesp), dos anos 2009 a 2011, textos ainda não publicados.
“Este dossiê visa não somente prestar uma homenagem ao querido professor Milton, mas também resgatar seus projetos de interpretação bíblica”. Rui Josgrilberg; Tércio Machado Siqueira




Testemunho sobre o Milton Schwantes


Vida de Fé - Testemunho de fé e amor aos pobres


Falar sobre uma pessoa querida é sempre um desafio difícil. Mas há que tentar, sobretudo quando se trata de um irmão maior. Milton Schwantes é uma dessas pessoas sobre quem há muito o que dizer e testemunhar. Ele foi pastor, professor de teologia, marido, pai, companheiro de lutas e sonhos. Foi um lutador incansável. Um renovador do estudo da Bíblia em toda a América Latina.
Quem o conheceu nas comunidades por onde passou, quem com ele estudou ou participou dos inúmeros cursos de leitura bíblica em todo o Brasil ou por diversos países da América Latina, e mesmo nos encontros pela Europa, saberá avaliar a importância e a grandeza de sua contribuição à igreja de Jesus e ao povo pobre de Deus durante seu abençoado ministério.
Milton foi um inspirador de caminhos de renovação bíblica, de uma leitura que tinha como ponto de partida a prática comunitária de fé e serviço, a luta dos pequenos por terra, pão e dignidade, a esperança de uma sociedade nova, em que mulheres e crianças sejam respeitadas e os pobres possam desenvolver toda a sua potencialidade humana.
A citação acima aparece num texto escrito por ele em 1988 quando do primeiro número da RIBLA, revista que ele fundou com colegas da hermenêutica bíblica de libertação como José Comblin, Carlos Mesters, Ana Flora Anderson, Gilberto Gorgulho, do Brasil, mas também Elsa Tamez, Pablo Richard, Jorge Pixley, da América Central. Desde cedo em seus estudos teológicos, Milton desenvolveu uma aguçada sensibilidade ecu­mê­nica, e suas andanças como biblista comprovam isso.
Uma de suas principais virtudes como amigo, mestre e colega de trabalho foi saber trabalhar em equipe. Ele incentivava, inspirava, coordenava e levava em frente projetos que jamais se prenderam à sua pessoa, embora recebessem de sua extraordinária capacidade de trabalho aquele incentivo que tanta diferença faz nos meios acadêmicos ou em nossas igrejas.
Milton nasceu de uma família de agricultores em Tapera, interior do Rio Grande do Sul, em 26/04/1946. Era o mais novo de quatro irmãos. Quando do falecimento de seu pai, ainda na infância, foi com sua mãe para São Leopoldo, onde dona Eugênia trabalhou por muitos anos como cozinheira no Instituto Pré-Teológico, escola de humanidades da IECLB que preparava para a Faculdade de Teologia.
Seus irmãos mais velhos, Nor­berto e Édio, decidiram pelo pasto­rado, caminho que o mais jovem também escolheu. Arlindo decidiu pelo magistério.
Brilhante já desde os estudos secundaristas, seu desempenho no curso de Teologia, concluído em 1970, habilitou-o para o doutorado, que realizou entre 1971-1974 em Heidelberg, sob a orientação do Dr. Hans Walter Wolff. Sua tese “O direito dos pobres” já adiantava o foco de sua leitura bíblica e o caminho de interpretação que seguiria ao longo da vida. Milton foi coerente até o fim, procurando sempre encontrar por debaixo dos textos a pequena brasa que ainda fumega para acender a fé do povo simples e, seguidamente, desprezado na sociedade, mas também nas igrejas. No prefácio da tese, ele escreveu que a obra decisiva de Gustavo Gutiérrez – Teología de la liberación – apontou para a importância das afirmações bíblicas sobre a pobreza para um testemunho cristão. Dessa perspectiva depende a autenticidade da pregação da mensagem evangélica. Essas palavras foram um mote de sua vida como cristão e teólogo.
De sua experiência continuaremos a aprender por muito tempo. Seus livros agora poderão ser lidos e relidos à luz de seu testemunho definitivo. Sobretudo o fato de que como igreja cristã, se não soubermos nos situar entre os des­fa­vo­re­ci­dos e angustiados, pouco en­ten­deremos da mensagem profética ou do evangelho de Jesus. Isso Milton procurou realizar como pastor em Cunha Porã (SC) ou em Guarulhos (SP), onde criou pequenos grupos comunitários que se reuniam nas garagens das casas de pessoas que desejavam partilhar a fé e uma leitura bíblica transformadora.
Quando Milton já estava em coma no hospital, Lori e eu fomos visitá-lo. Junto com a esposa Rosi conversamos e oramos com ele. Ela disse que era importante falar com ele, pois – de alguma forma – ele sentia o que lhe transmitíamos. Nós esperávamos seu restabelecimento, seu espírito era forte, mas a fraqueza do corpo o venceu. Ao nos despedirmos, li para ele um poema de Dom Pedro Casaldáliga, que fala de Jesus como o libertador total de nossas vidas, contradição e paz, vivente em Deus e no pão repartido, incapaz de ser reduzido ao que fazemos dele ou da fé que recebemos. Foi um preito de gratidão pelo testemunho de uma vida de fé, esperança e amor.

Roberto Zwetsch. Teólogo e professor da Faculdades EST em São Leopoldo (RS)
        Fonte: Novolhar

Entrevista com Milton Schwantes


Flor onde a luz é pouca: um bate papo sobre leitura popular da Bíblia com o teólogo Milton Schwantes

(...) “Você já viu a violetinha em flor lá no cantinho da cozinha?" Eis o boato que corre. E cada qual vai lá apreciar seu encanto. “E, olha, lá meio escondido, mais dois botõezinhos!". “Ah, que lindo!" E lá vamos à cozinha, a ver as florzinhas. Até parece peregrinação. E quem vem de visita é, em seguida, conduzido à florzinha, no cantinho da cozinha. Deu-me a idéia de que aí temos um Evangelho. Vem do cantinho. Lá no meio de um escuro lugar se nos anuncia uma boa-nova: há flor até onde a luz é pouca (...). Texto de Milton Schwantes, para o devocionário 365 Dias com Deus, Editora Cedro).
Um dos maiores biblistas do país, com título de doutorado na Alemanha e obras reconhecidas internacionalmente, o teólogo Milton Schwantes escolheu o caminho da simplicidade. Fala da Bíblia como quem fala de um amigo íntimo, gente de casa, diante dequem já não existe cerimônia ou formalidade. Nada mais natural. Para Schwantes, pastor da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), a leitura da Bíblia é transformadora quando nasce da vida do povo, do cotidiano de lutas e da esperança que se renova diariamente. Ele é uma das referências no Brasil e no exterior em “leitura popular da Bíblia”, tema sobre o qual falou à revista Signos de Vida (CLAI, n. 56, Julio 2010).

Descreva brevemente sua trajetória acadêmica. Qual foi o tema de sua tese dedoutorado em Antigo Testamento?
“O direito dos pobres no Antigo Testamento” foi o tema do doutorado que eu levei para a Alemanha, para a Universidade de Heidelberg. Apresentei o tema ao meu orientador, o professor Hans Walter Wolff, que, a princípio, não gostou muito da ideia. Era algo muito novo, a Teologia da Libertação ainda estava nascendo na América Latina. Hoje, meu trabalho é muito mais usado lá do que foi na época. Foi publicado em alemão (Das Rechtder Armen) e em português deve sair ainda este ano. Estou trabalhando no texto.
Minha formação teológica começou em São Leopoldo, Rio Grande do Sul. No curso pré-teológico, além das disciplinas do Ensino Médio, a gente aprendia latim e grego. Em 1970, concluí o curso de teologia pela EST (Escola Superior de Teologia). Na Alemanha não havia mestrado, fui direto para o doutorado. Voltei da Alemanha em 1974 e a carreira acadêmica já era prevista; a Igreja não tinha muitos doutores naquela época. Mas antes de entrarem na sala de aula, primeiro os doutores tinham que ir para a paróquia! Fui para Cunha Porã, em Santa Catarina, onde fiquei até 1978, quando, então, comecei a dar aulas na Faculdadede Teologia em São Leopoldo. Lecionei em São Leopoldo até julho de 1987. Em 1988, comecei a dar aulas na Universidade Metodista de São Paulo, na graduação em Teologia e na pós em Ciências da Religião, além de exercer o pastorado em Guarulhos. Sempre fui pastor. Apenas recentemente deixei o trabalho da Igreja porque a saúde não permite mais (em 2002, o professor Schwantes sofreu uma cirurgia que deixou algumas sequelas). Em 2002, recebi um doutorado (Honoris Causa) pela Universidade de Marburg, Alemanha. Em 2008, o Instituto de Estudos Superiores, ITESP, que é da Igreja Católica, também me concedeu o título de Doutor Honoris Causa; a iniciativa partiu dos estudantes.

Como despertou em você a leitura popular da Bíblia? Quais são as motivações que o impulsionaram nesta linha de pesquisa?
Estava no segundo ou terceiro ano de teologia quando li Richard Shaull (Pastor presbiteriano, o missionário norte-americano Richard Shaull (1920-2002) é considerado um dos precursores da Teologia da Libertação. Missionário na América Latina entre as décadasde 40 e 50, Richard Shaull deu aulas o Brasil entre 1952 e 1962.) . Realizei um seminário sobre Shaull em 1968. Ele formulou uma “teologia da revolução”, a Bíblia presente nas transformações sociais. Não era um apelo revolucionário, mas a compreensão da responsabilidade cristã nesse contexto de mudanças. Toda a minha geração foi influenciada por ele. Foi do Richard Shaull que nasceu o tema do doutorado. A Teologia da Libertação estava surgindo na América espanhola, mas as informações demoravam a chegar. Li uma tradução em alemão do Gustavo Gutierrez (O padre peruano Gustavo Gutiérrez (1928) é autor do livro “A Teologia da Libertação”, escrito após sua participação na Conferência Episcopal de Medellín, de 1968.), quando estava em Heidelberg.
A leitura popular da Bíblia é um pouco mais tardia. Nos anos 70 Frei Carlos Mesters aderiu à Teologia da Libertação quando ainda fazia uma leitura da Bíblia antiga, não popular, de um jeito dogmático. Foi do contato com o pobre – não mais como objeto, mas como sujeito do estudo da Bíblia – que nasceu essa nova forma de ler e interpretar a Palavra de Deus. Em 1979, Frei Carlos fundou o Centro de Estudos Bíblicos, o CEBI, com o projeto de estudar “Bíblia e Vida”. Em 1975, voltando da Europa, eu citei Frei Carlos em um trabalho, mas ainda não o conhecia pessoalmente. Conheci o CEBI e Frei Carlos Mesters pessoalmente em 1979 e comecei a trabalhar com leitura bíblica popular. Trabalhei sempre para criar um grupo bíblico para servir à Igreja.

Qual é o objetivo da leitura popular da Bíblia? Como ela acontece na comunidade?
Para chegar a uma leitura popular da Bíblia as pessoas entram com a vida. Quando saímos do método de ensino tradicional as pessoas vão tomando a palavra e se ensinam. É muito bonito. É algo muito impactante sempre. Porque você sabe o começo da reunião bíblica, mas nunca sabe o fim. Quando comecei em Guarulhos com círculo bíblico, eu achava que tinha que escolher o tema. Propus o Evangelho de Mateus, que é tão lindo, mas falei sozinho... Então, eu disse: “Vamos escolher um que gostamos”. E o povo respondeu rápido: “Apocalipse!” Achei muito difícil e escolhi outro Evangelho... Prometi Apocalipse para um outro estudo, no futuro. O povo é de uma paciência maravilhosa! Então, quando começamos com Apocalipse eu já não tinha mais a palavra, eram eles que falavam. Diziam: “É muito difícil, pastor, mas eu acho que é assim...”.
Em Guarulhos, quem pediu o estudo bíblico foi a própria igreja. Eu respondi: “Quem fizer o estudo vai ter que dar estudo também”. Tem muita gente que estuda a Bíblia só para encher a pança. São consumidores da Bíblia. Queria gente andando na rua, vivendo a Bíblia. Nas casas, os assessores bíblicos iam de dupla: um cantava e o outro lia a Bíblia. Às vezes eles diziam: “Ainda não, pastor, a gente tem que cantar melhor”. Então fizemos um cancioneiro e todos ensaiaram. Todo mundo tinha que estar apto. No começo eles ficavam muito preocupados. “Mas e se eles fizerem perguntas, pastor?” E eu respondia: “Não precisa responder, deixa a turma falar”.

Você acompanhava todos os grupos de estudo bíblico nas casas, dava algum tipo demonitoria?
Não, eu participava de um grupo também, como todos os demais. Tinha a mesma experiência deles. Os cursos duravam dois meses. No final, fazíamos um encerramento todos juntos, com um culto.
Então os cursos não ocorriam semanalmente, como nas Escolas Dominicais?
Estudo Bíblico toda semana não dá, a turma cansa. Ou, então, frequenta por costume quando, na verdade, o objetivo é fazer missão. Os estudos são limitados no tempo e no tema. Por exemplo, estudávamos Lucas 1 e 2 antes do Natal.

Mas o grupo não se dispersava após o término do estudo?
Que nada, na outra sessão estavam lá de novo, para estudar, cantar, para falar com o vizinho, comer... Chegamos a ter 19 grupos ao mesmo tempo.

Que desafios e que benefícios recebem as comunidades que se deixam motivar pela leitura popular da Bíblia?
Quem estuda a Bíblia tem que lidar com bazar, criança faminta, favelas, visitas... se não fizer, este trabalho não adianta. A leitura popular da Bíblia tem que estar inserida num projeto de igreja. Minha igreja fazia bazares e o grupo de estudo bíblico também tinha que estar envolvido no trabalho, recolhendo roupas para vender depois a dez centavos...
O estudo popular da Bíblia muda a comunidade rapidamente. Não pelo estabelecimento deuma moral, mas de uma alegria. A igreja de Guarulhos, que era reacionária e conservadora, agora é toda de esquerda. Fiz lá um trabalho no campo político. Por exemplo, realizamos na igreja um encontro sobre socialismo em Cuba e levei uma pessoa do Consulado para falar. Também levei um historiador, que falou da história de Guarulhos. A comunidade tem que saber quem ela é e como está.
Fazíamos encontros semestrais sobre temas específicos. Uma vez discutimos se Jesus havia sido sacrificado ou assassinado. Foi uma “pauleira”! Mas eu disse: “Aqui todo mundo fala o que pensa”. Os alemães foram embora (risos). Já a igreja cresceu: de 50, foi para uns 700 membros.

Esta leitura popular da Bíblia tem cores confessionais? Ela pode ser um fator de unidadedos cristãos?
O grupo se reúne nas casas, cantando e estudando a Bíblia. O estudo nas casas é aberto, todo mundo participa, não existe cor confessional. Numa ocasião, estudando Êxodo 3, fomos até duas horas conversando. As famílias vieram e se sentaram conosco dizendo: “Vocês estão loucos, não voltam mais para casa?”. Sentaram e ficaram. Estávamos estudando quem é Deus. Foi demais de lindo. Êxodo 3 é um dos textos mais lindos sobreDeus. Fala sobre Deus e as plantas, fala sobre libertação. Ninguém esquece quem é Deusdepois de uma experiência assim.
A leitura bíblica comunitária é o grande evento na América Latina e tem a ver com o mundo católico. Isso é assim não porque o papa é bom ou por causa dos padres, pois eles não sabem muito da Bíblia, lamentavelmente. É por causa dos leigos e das mulheres. A leitura popular é um fenômeno leigo católico. Por isso o movimento bíblico continua forte, e está se renovando porque acontece em setores não controlados das igrejas. O povo não depende dos padres para ler a Bíblia. Em contrapartida, o mundo protestante tem problema com a leitura bíblica. A maioria dos pastores também não conhece Bíblia. Mas a presença do pastor é muito grande no mundo protestante; nosso grupo acaba repetindo o que os pastores dizem. Então, temos muito a aprender com os católicos. A leitura da Bíblia é ecumênica.

Como você avalia o interesse das comunidades pelo estudo da Bíblia?
Na América Latina fala-se muito que a Teologia da Libertação terminou. Mas não a leitura popular da Bíblia, que continua em pleno vigor. A organização cristã Visão Mundial convidou-me para visitar Recife. No Brasil, a Visão Mundial era extremamente conservadora há 30 anos. Mas hoje ela é uma nova instituição no Brasil. Em Recife, reuniram-se pessoas devários grupos da Visão Mundial no país. Um metodista presidia; vários eram mais ou menos pentecostais. O resultado foi uma grande surpresa: era como se eu estivesse nos anos 70, os tempos do começo da Teologia da Libertação. Com as falhas dos anos 70, mas com as alegrias também. Naquele lugar, havia jovens, leigos e leigas, pastores e pastoras num encontro de releitura da Bíblia. Fiquei muito impressionado porque essas pessoas não conhecem a leitura bíblica latino-americana. Então, o que estava acontecendo era um novo acesso à Bíblia sem mediação da Teologia da Libertação, mas que era Teologia da Libertação. Uma leitura pentecostal e leiga, com toda a força da leitura popular da Bíblia.
Também estive em Vitória, em um seminário particular, não vinculado a nenhuma igreja e com cerca de mil alunos, a maioria pentecostais. Falei lá da mesma maneira que falo na Universidade Metodista e nos entendemos muito bem. Também visitei o CEBI em Vitória. O grupo tem mais de 50 pessoas, integrantes de igrejas históricas e pentecostais. É um grupo que as igrejas não controlam e eles trabalham muito na assessoria bíblica.

Quais são as ênfases em suas aulas quando você está diante de uma turma deestudantes de teologia? 
É preciso acentuar as coisas dos dias de hoje. O comentário político também é importante. Pergunto aos meus alunos: “Vocês ajudam os pobres na igreja de vocês? Quem trabalha com os pobres?” Isso é sério! A Bíblia é uma ajuda para chegar ao pobre. Eu tendo a diminuir a Bíblia e aumentar a vida. Cada pessoa precisa sentir que faz parte da Bíblia. Leio com eles Marcos 4, por exemplo. Lá existem várias parábolas. A parábola do lavrador e da semente, por exemplo, são duas parábolas masculinas. E os homens se sentem seguros porque estão na Bíblia. Mas também mostro a parábola do grão de mostarda, que é uma hortaliça. A mostarda não está na roça, está na horta, que fica sempre junto à casa. O que está junto à casa é atividade da mulher. A mostarda é uma plantinha para os pássaros, um abrigo. Há uma conceituação feminina por trás desta parábola. Percebê-la quebra o fundamentalismo porque se percebe que cada pessoa tem parte na Bíblia: homem, mulher, jovem, idoso. A verdade não fica num só lugar.

Você percebe um interesse crescente pela leitura popular por parte dos estudantes deteologia? E na pós-graduação?
Sem dúvida! Há muito interesse, sobretudo entre os pentecostais. O povo gosta decelebração carismática, eufórica e também quer estudar. Nunca vi ninguém contra a leitura popular da Bíblia, eles querem aprender. Na graduação basta trabalhar mais sistematicamente. Na pós-graduação da Universidade Metodista tenho uma classe de 25 alunos, dos quais existe apenas uma pastora metodista. O restante da classe é quase todo pentecostal.
Em geral, o aluno não conhece a Teologia da Libertação porque o livro é muito caro. Estudante de Teologia é pobre. Vai ler o que o pastor empresta. Livro do Boff ele não consegue comprar. Se os alunos tivessem acesso a livros, eles leriam. Por isso edito os meus livros e vendo a cinco e sete reais. Não escrevo para ganhar dinheiro. Na verdadeestou investindo o dinheiro da minha vida editando livros. Para vender por cinco reais, tenho que fazer três mil exemplares, que me custam dez mil reais. Tenho que vender um semestre, para fazer mais dez mil. As editoras esquecem que estudante de teologia é pobre. Vendi livros na Europa por dois euros e tive lucro acima de 1 euro por livro.

Você está escrevendo um livro nestes dias? Qual é o seu último livro publicado e do que trata?
Estou editando Oséias agora e Êxodo 1 a 6. Vou publicar quanto tiver dinheiro. Meu último livro publicado é Sabedoria e Provérbios, que vendo a sete reais. Ele traz comentários sobre capítulos inteiros de Provérbios, um livro que enfoca a vida do dia a dia. Também lancei recentemente Sofrimento e esperança no exílio e História de Israel – Local e origens, os dois a sete reais. E existe ainda o Breve História de Israel a cinco reais. Quem estiver interessado pode escrever ao meu e-mail (milton.schwantes@metodista.br). As despesas do correio são por minha conta.

Quais dos seus livros já foram publicados em espanhol e onde podem ser adquiridos?
Tenho quatro livros em espanhol. Editei Gênesis 1 a 11 no Peru; História de Israel e Exílio no Equador; Amós em Costa Rica; Ageu em Buenos Aires. Mas preciso reeditá-los. Os livros que não forem reeditados vão para a internet. Ainda não tenho site, mas já existe uma pessoa criando um para mim. A idéia é publicar todos os ensaios; minhas filhas estão ajudando.

Você continua participando do movimento latino-americano de Leitura Popular da Bíblia?
Com algumas limitações, mas continuo em contato com a Rede Ecumênica Bíblica Latino-americana e Caribenha, REBILAC. O site é www.rebilac.net. É uma instituição informal, que se reúne periodicamente e está na mão de leigos. Devo ir a Lima, Peru, em novembro de2010, quando haverá o encontro continental. Participo também da Revista de Interpretação Bíblica Latino-americana, RIBLA, que ajudei a criar nos anos 90. Ela também tem um site: www.ribla.org.

E a Bibliografia Bíblica Latino-Americana? Como ela está organizada e quais são os objetivos deste projeto? 
A Bibliografia Bíblica Latino-Americana começou em 1988, como parte do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo. O projeto está ligado à área de Literatura e Religião no Mundo Bíblico. Publicamos oito volumes com as publicações bíblicas referentes a 1988 até 1995 e agora todos os dados estão na Internet (http://www.metodista.br/biblica).
Ela está um pouco atrasada; há muito material. Não pensei que houvesse tanto material na América Latina. É necessário ler e fazer uma síntese. Pois a bibliografia não apenas indica o material bíblico produzido na América Latina e Caribe como orienta quanto ao conteúdo, trazendo resumos de cada ensaio e livro. Temos uma pessoa contratada só para digitar e publicar na internet. A Bibliografia traz todos os livros latino-americanos. Não existe outra iniciativa dessa em lugar nenhum do Brasil. Ela será importante só daqui a 10, 15 anos.

Entrevista realizada pela jornalista Suzel Magalhães Tunes, de São Paulo, Brasil, em junho de2010, para revista NovOlhar, da Igreja Luterana.

sábado, 13 de abril de 2013

Livros do Milton Schwantes

O prof. Milton vendia seus livros a preço de custo, a maioria dos títulos eram vendidos por menos de R$ 8,00.
Pelo que sei nenhum teólogo hoje no Brasil vende livros a preços acessíveis a todos como Milton Schwantes vendia.


     


A editora Oikos publicou vários livros do Prof. Milton Schwantes.


Oikos


sábado, 6 de abril de 2013

Águas que correm mansamente: um comentário a partir de Is 8,5-8. Milton Schwantes


Belo artigo do prof. Milton publicado na TQ, revista de teologia da Faculdade Dehoniana de Taubaté/SP.
Segue abaixo um breve resumo do artigo.




Águas que correm mansamente: um comentário a partir de Is 8,5-8

Milton Schwantes

Resumindo a mensagem de Isaías 8.5,8: Judá será inundado pelas águas do Eufrates. Ao rejeitar o seu Senhor (as águas mansas), sujeitou-se aos que aniquilarão! A sub-unidade de 8.11-15 reforça o sentido de 8.5-8. Pois, nestes v.11-15 o templo, dedicado a Iaweh em Jerusalém, é “pedra de tropeço” para os senhores de Jerusalém e de Judá. Há, aqui, esperanças medidas pelo santuário. Esta é, precisamente, uma das especificidades isaiânicas. Pois este nosso profeta difere de outros: ele tem no templo, dedicado a Iaweh em Jerusalém, um de seus decisivos conteúdos místicos e teológicos. Contudo, este templo não é propriamente, ele nem é sede de sacrifícios, tão criticados por Isaías em 1.10-17. Mas é lugar da oração e da torah (2.2-5); e é também abrigo dos pobres (14,32).
Água, vida da terra. TQ, Teologia em Questão. Taubaté/SP: Faculdade Dehoniana. Ano II. 2003/2. p. 45

Revista Estudos Bíblicos, homenageia Milton Schwantes


Textos bíblicos, frutos de experiências transformadoras e a memória de Milton Schwantes

Revista Estudos Bíblicos

Vol. 29 - N. 114 ABR/JUN 2012
Revista publica pela Editora Vozes
Número elaborado pelo grupo de biblistas do Centro-Oeste




Se Milton Schwantes era o pai da Bibliografia Bíblica Latino-Americana, era o irmão da Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana (RIBLA) e da revista Estudos Bíblicos. Estas revistas tem o rosto dele. A revista Estudos Bíblicos, por este número, homenageia o seu irmão querido. Vários articulistas o homenagearam, ou no início do artigo, ou durante o corpo do texto.

Colaboradores:
Joel Antônio Ferreira. Editorial, p. 7
Carlos Mesters e Francisco Orofino. O Caminho por onde caminhamos, 11
Marcelo Barros: Salmos das travessias. Conversa com Milton Schwantes sobre o salmo 121, p. 19
Ivoni Richter Reimer e Haroldo Reimer. Misericórdia quero! Uma ética  do cuidado a partir das entranhas, p. 27
Joel Antônio Ferreira. Apocalíptica no Evangelho de Marcos e uma lembrança do Milton, p. 38
Valmor da Silva. Do campo para a cidade e da cidade para o campo, p. 47
Paulo Ueti. Encontros e desencontros que transformam. Mutatis Mutandis: Luta e transgressão como conspiração evangélica, p. 61
Clodoaldo Moreira dos Santos Júnior e Roberto Francisco de Oliveira. Gálatas: Discurso e realidade. Elementos de uma leitura conflitual, p. 75
Carla Naoun. Tamar: a mulher que pensávamos conhecer, p. 87
Célio de Pádua Gracia. Uma leitura do livro de Rute: mulheres pobres e transgressoras do judaísmo, p. 97
Maria Aparecida de Castro. Rute: símbolo da força feminina, p. 109
Paulo Rodrigues Ribeiro. Reflexões sobre a genealogia de Jesus em Mateus, p. 119
Livros recebidos, p. 135

Profeta do Povo de Deus


Revirando meu baú de revistas antigas, encontrei as revistas Temo e Presença que eram publicadas pelo CEDI, Centro Ecumênico de Documentação e Informação. Tive o gozo de reler vários artigos do professor Milton Schwantes.
Abaixo compartilho um breve resumo de um dos artigos do renomado mestre.         



Profetas são gente do povo


Não aparecem por decisão própria. Não são frutos do acaso. Sua atuação não está desenraizada. São filhos do povo. Dão voz a este povo que os gera. Sua raiva e seus sonhos denunciam e anunciam as causas populares.
Denunciam a injustiça que sofrem com o povo. A injustiça que sofre quem não tem o que comer. Gritam a dor de órfãos e viúvas. Dão voz à dor dos camponeses que suam mas não comem, porque outros vivem. “Comeis a carne do meu povo!”. (Mq 3.3). Denunciam a injustiça deste salário-mínimo desavergonhado.
Descrevem o encanto da esperança. Evocam a beleza de crianças que brincam com cobras (Is 11). Que beleza não será a vida, quando todos puderem saborear um gole de vinho (Mq 4.4). o profeta conduz ao inusitado. Conta com o milagre. Canta o porvir.
Sim, no profeta explode a vida do povo de Deus, em seus dissabores e em seus sabores. Miserável o povo que não suscita profetas!

Artigo do Prof. Milton Schwantes na revista Tempo e Presença. Publicação do CEDI. Número 208, Maio de 1986. Bíblia Hoje: Profetas do Povo de Deus. p. 34.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Orientador do Milton em Heidelberg.

Hans Walter Wolff, orientador de pós-graduação do prof. Milton Schwantes em Heidelberg.


“Estudei no Pré-Teológico, em São Leooldo, que era uma formação anterior à teologia. Aprendia-se grego e latim além das outras disciplinas do atual Ensino Médio. Depois fui estudar Teologia, formando-me em meados de 1970. A Igreja, que tem muito contato com a Europa, me encaminhou para um estudo de pós-graduação na Alemanha, em Heidelberg. Estudei de 1971 a 1974 e terminei o doutorado em Antigo Testamento, com um professor que foi muito especial, Hans Walter Wolff”. Milton Schwantes




HANS WALTER WOLFF nasceu em 1911, na cidade de Barmen [Wuppertal], Alemanha. Pastor protestante. Em 1942 conclui o seu doutorado na Universidade de Halle com uma tese sobre a “Interpretação de Isaías 53 no Cristianismo primitivo”. De 1946 a 1949 Wolff foi pastor do distrito quarto da comunidade protestante em Solingen-Wald, além disso, era professor da Universidade de Wuppertal. Foi também professor nas Universidades de Mainz e de Heidelberg, onde ensinou até a sua aposentadoria. O campo de suas pesquisas foi sempre os profetas. Junto com Martin Noth e Hans Joachim Kraus, e mais tarde Siegrified Herrmann, desenvolveu a série: Comentários Bíblicos do Antigo Testamento, assumindo os comentários dos doze profetas menores e outros livros proféticos. É considerado no mundo como um dos maiores especialistas de Teologia do Antigo Testamento e pioneiro nos estudos de Antropologia do Antigo Testamento.
Wolff, faleceu em 1993 em Heidelberg, Alemanha, aos 76 anos de idade.




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